segunda-feira, 19 de abril de 2010

PRAZO DE IMPUGNAÇÃO CONTENCIOSA DE ACTO ADMINISTRATIVO

Interpretação do art.º 59º, nº 4, parte final, do CPTA:

“ A utilização dos meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal”.

Analise mos:Com a reforma do contencioso administrativo o CPTA abandonou o conceito de definitividade, permitindo a impugnação de qualquer acto com eficácia externa, independentemente de se encontrar inserido num procedimento administrativo (nº 1 do art.º 51 do CPTA).Não existindo qualquer exigência de recurso administrativo como condição necessária para a impugnação contenciosa, prevê-se a suspensão do prazo para esse efeito, quando tenha sido interposto meio de impugnação administrativa, independentemente da sua natureza, tal como já foi referido (nº 4 do art.º 59º do CPTA). O particular terá assim vantagem em formular, em primeiro lugar, um recurso ou reclamação administrativa, nunca perdendo a possibilidade de, posteriormente, caso a resposta não seja favorável, impugnar contenciosamente o acto.”A lei não estabelece qualquer exigência relativamente a uma hipotética impugnação administrativa prévia do acto que se pretende atacar judicialmente. Nem o art.º 51º, nem o nº 4 do art.º 59º do CPTA, contém tal exigência (que, a existir, seria seguramente feita numa destas disposições).O CPTA contém também regras aplicáveis à contagem dos prazos: o art.º 58º, nº 3, remete para o regime constante do Código de Processo Civil e o art.º 59º dispõe relativamente ao início da contagem dos prazos. O nº 4 deste artigo merece uma referência especial, na justa medida em que derroga o nº 2 do art.º 164º e o nº 3 do art.º 170º, ambos do CPA: ao contrário do que aqui se preceitua, todos os meios de impugnação administrativa, ainda que hajam de ser qualificados como facultativos, suspendem o prazo de impugnação contenciosa.”
Já referi que a impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal. Qual será o prazo a que se refere esta expressão “ou com o decurso do respectivo prazo legal”?Esta expressão só poderá ter quatro significados:
1- O prazo (legal) de impugnação contenciosa;
2- O prazo (legal) de notificação da decisão que recair sobre a impugnação administrativa;
3- O prazo (legal) da decisão da impugnação administrativa.
4-o prazo (legal) para utilização dos meios de impugnação administrativa;

De acordo com a primeira hipótese o prazo (legal) de impugnação contenciosa:
→ Esta hipótese parece liminarmente de afastar porque, se estamos a falar de suspensão do prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, não faz sentido dizer que tal prazo de suspensão contenciosa retoma o seu curso com o decurso do mesmo prazo de impugnação contenciosa. Pois defender a opinião contrária seria o mesmo que dizer que não haveria lugar a qualquer suspensão de tal prazo. Esta primeira hipótese está afastada.
Quanto à segunda hipótese o prazo (legal) de notificação da decisão administrativa que recair sobre a impugnação administrativa:
→ Esta hipótese é liminarmente de afastar porque o particular (impugnante) só sabe, em princípio (e sempre, para efeitos impugnatórios), da decisão administrativa quando é notificado desta, pelo que o prazo (legal) para a notificação da mesma decisão lhe é desconhecido.
Quanto à terceira hipótese o prazo (legal) da decisão da impugnação administrativa:
→ Normalmente, a impugnação administrativa é feita através de Reclamação, cujo prazo de interposição é de 15 dias (art.º 162º do CPA) e cujo prazo de decisão é de 30 dias (art.º 165º do CPA) ou de Recurso Hierárquico, a interpor no prazo de 30 dias, se for necessário (art.º 168º, nº 1 do CPA), ou no prazo estabelecido para a interposição de recurso contencioso, se for facultativo (art.º 168º, nº 2 do CPA), devendo a correspondente decisão ser proferida no prazo de 30 dias, podendo ser elevado até ao máximo de 90 dias, sendo que, decorridos tais prazos se considera haver indeferimento tácito do recurso hierárquico (art.º 175º do CPA).Desta forma, o prazo (legal) para a decisão da Reclamação é sempre de 30 dias, sem qualquer outra consequência para a sua falta e a do Recurso Hierárquico, em qualquer das suas modalidades, é de 30 dias, podendo, no facultativo, ser elevado até 90 dias, e havendo falta de decisão, considera-se o recurso hierárquico tacitamente indeferido.Se a interpretação do art.º 59º, nº 4 do CPTA, parte final, fosse a de que o prazo em causa fosse o (legalmente previsto) da decisão administrativa que recai sobre a impugnação administrativa, teríamos, necessariamente, que a suspensão do prazo de impugnação contenciosa nunca seria superior a 30 dias (ou 90, no máximo, no caso de ter havido recurso hierárquico facultativo), o que seria manifestamente irrisório face à morosidade dos procedimentos administrativos e do contencioso que deles conhece e muito contraditório com a reforma de 2004 que preconiza, “um reforço de garantias de acesso à justiça”, no âmbito do contencioso administrativo.Por outro lado, segundo tal tese, teríamos o quase-absurdo de o legislador falar em suspensão do prazo de impugnação contenciosa até à notificação da decisão que recaísse sobre a impugnação administrativa, que só teria efeitos se tal decisão administrativa fosse proferida antes de 30 dias, na pior das hipóteses, ou de 90 dias, na melhor delas, já que, em todos os casos, como vimos, o prazo (legal) máximo de suspensão seria de 30 dias ou, no máximo de 90 dias.
Isto é: A notificação da decisão sobre a impugnação administrativa ficaria consumida pelo prazo legal em que a decisão deveria ser proferida, o que parece, desde já, absurdo. Ou seja, o particular impugnaria administrativamente o acto administrativo, mas a suspensão do prazo de impugnação contenciosa só ocorreria dentro do prazo para ser proferida, legalmente, a decisão administrativa e a notificação desta decisão administrativa só teria a virtualidade de suspender o prazo de impugnação contenciosa dentro do mesmo prazo para ser proferida, legalmente, a decisão administrativa, o que é manifestamente absurdo, por manifestamente contraditório com a primeira parte do preceito em causa e com todo o espírito (e letra) da reforma do contencioso administrativo de 2004. É também de rejeitar esta terceira hipótese.
Por último, a quarta hipótese o prazo de suspensão da impugnação contenciosa retoma o seu curso com o decurso do prazo (legal) para a utilização dos meios de impugnação administrativa:
→ Esta hipótese verifica-se quando não tenha havido lugar a impugnação administrativa.Ou seja: o prazo de impugnação contenciosa de acto administrativo suspende-se até à notificação da decisão que recair sobre a impugnação administrativa (quando se define o acto impugnado administrativamente) e suspende-se também enquanto decorrer o prazo (legal) para a utilização dos meios de impugnação administrativa (que pode não ter sido interposta).Em termos sintéticos podemos dizer que:
● Tendo havido impugnação administrativa, o prazo para a impugnação contenciosa é suspenso (sempre), só voltando a correr com a notificação da decisão administrativa que conheça daquela impugnação administrativa:● Enquanto decorrer o prazo para a impugnação administrativa, suspende-se (sempre) o prazo para a impugnação contenciosa; esgotado que seja o prazo (legal) para utilização dos meios de impugnação administrativa, sem que esta tenha sido interposta, volta a correr o prazo para a impugnação contenciosa; mas se tiver sido interposta impugnação administrativa o regime a aplicar é o do número anterior.

Fatima Marques Sub8

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