segunda-feira, 24 de maio de 2010

Acção Administrativa Comum - Uma Visão Geral sobre o seu Âmbito de Aplicação

Antes de mais, esta acção comum é aplicável a todos os litígios sujeitos à jurisdição administrativa sobre os quais não esteja de forma expressa regulado e estabelecido um regime especial, isto é, todos os litígios que não devam estar sujeitos à acção administrativa especial ou não devam consistir num processo urgente. É esta a ideia que é estabelecida pelo nº1 do artigo 37º do CPTA.

Deste modo, se não estiver em causa um litígio referente à prática ou omissão de um acto administrativo, o meio adequado para impulsionar a pretensão do particular e para este ter acesso à justiça administrativa é a acção administrativa comum. Logo, a acção administrativa comum não serve para impugnar um acto, para pedir a anulação de um acto, para condenar a administração a praticar um acto, mas serve para deduzir, por exemplo, um pedido de responsabilidade civil da administração.

Nestes termos, o nº2 do artigo 37º enumera exemplificativamente algumas situações que estão reconduzidas à acção administrativa comum, enquanto meio adequado de acesso à justiça administrativa. Recorrendo à organização sistemática que o Prof. Vieira de Andrade faz nas suas lições, chamamos à atenção para as seguintes situações:

a) Acções de reconhecimento, previstas nas alíneas a) e b), que correspondem essencialmente a acções de simples apreciação.
b) Acções impositivas e acções inibitórias, previstas na alínea c), que correspondem a verdadeiros pedidos de condenação.
c) Acções de restabelecimento, previstas na alínea d), que podem consistir na reconstituição da situação natural no âmbito de um pedido de indemnização (responsabilidade civil), sendo que pode ser cumulado como pedido impugnatório, quando se trate na reconstrução de uma situação actual hipotética, por via da anulação de um acto administrativo.
d) Acções de prestação, previstas na alínea e), que consistem em condenar a Administração a proceder aos cumprimentos dos seus deveres de cariz obrigacional (ex: prestação de cuidados de saúde e de educação).
e) Acções de reposição, previstas nas alíneas g) e i), que consistem em pedidos de reintegração patrimonial decorrentes da imposição de sacrifícios por razões de interesse público e do enriquecimento sem causa. É preciso fazer uma ressalva quanto a esta matéria: estes pedidos não se confundem com as acções de responsabilidade tradicionais, pois aqui não estão em causa actuações ilícitas ou ilegais.

Posto isto, há que fazer referência a dois outros pedidos de cariz tradicional e que ocupam grande importância na discussão doutrinária sobre este tema.

A) Pedidos relativos aos Contratos (Contencioso Contratual)

A alínea h) do nº2 do art. 37º estabelece que as acções sobre contratos podem ser utilizadas para resolução de litígios de cariz contratual que envolvam sobretudo questões de interpretação, validade ou execução desses contratos.

1) Quem pode deduzir estes pedidos?

1.1 Quanto à validade

O regime da legitimidade encontra-se plasmado no artigo 40º do CPTA, e como não poderia deixar de ser atribui-se, desde logo, legitimidade as partes do contrato para a dedução de tais pedidos (alínea a). Para além de se atribuir legitimidade à acção popular e acção pública (nos termos da alínea b), o código atribui legitimidade a todos os particulares susceptíveis de ser lesados pela celebração dos contratos, em especial, aqueles que foram prejudicados por não ter sido seguido o procedimento prévio exigido pela lei, nos termos de alínea c); aqueles que intervieram no contencioso pré-contratual, nos termos da alínea d); aqueles que participaram no procedimento e que verificam que as cláusulas são diversas dos termos da adjudicação, nos termos da alínea e); os que não participaram no concurso mas que poderiam ter participado se tivessem sido apresentados os requisitos constantes do clausulado, nos termos da alínea f) e aqueles que são afectados pela execução do contrato, nos termos da alínea g).

É pertinente fazer aqui uma referência à crítica que o Prof. Vasco Pereira da Silva faz em relação a admitir-se legitimidade à acção popular, uma vez que estamos perante uma relação jurídica administrativa fundada num negócio jurídico bilateral, sendo que não estamos perante uma relação decorrente de uma actuação unilateral da administração. Deste modo, a noção de contrato parece ser incompatível com a abertura do processo a quem seja estranho a esta relação jurídica. Assim, não faz sentido considerar-se que os direitos constituídos por via contratual são ao mesmo tempo relativos e absolutos, uma vez que decorrem da vontade das partes e são oponíveis erga omnes, sendo que não faz sentido dizer que são integrantes de uma relação criada pelos sujeitos concretos, mas é aberta a toda a sociedade.

1.2 Quanto à execução

O nº2 do artigo 40º estipula uma legitimidade mais restrita em comparação com o disposto no nº1. Assim, são apenas legítimos: os contraentes (aliena a), o actor público e popular (aliena c) e d), os afectados e lesados pela execução do contrato e pela preterição do procedimento prévio (alínea b) e e).

2)Quais são os prazos aplicáveis?

Neste caso, temos aqui regras que são diferentes das que vimos para a acção administrativa especial. Assim, o prazo para os pedidos de anulação dos contratos é de 6 meses, segundo o nº2 do artigo 41º. Por outro lado, nos restantes casos, o nº1 do artigo 41º parece estabelecer que a acção administrativa comum não está sujeita a prazo, podendo ser interposta a todo o tempo.

B) Pedidos relativos à responsabilidade civil (Contencioso da Responsabilidade Civil Pública)

Este pedido vem referido na alínea f) do nº2 do artigo 37º do CPTA, que estipula que são acções administrativas comuns aquelas que tenham por objecto questões conexas com a responsabilidade civil extracontratual por actos do Estado e demais entidades públicas, para além da responsabilidade sobre os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes.

Aqui, nesta matéria, surge com elevada importância a Lei 67/2007 que estabeleceu o novo Regime Jurídico da Responsabilidade Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas.

Para o Prof. Vasco pereira da Silva, este regime ficou bastante aquém das expectativas. Em primeiro lugar, porque o regime ao aplica-se aos danos provenientes do exercício da função administrativa, legislativa e jurisdicional (1º, 1) o que por via das fortes criticas desviou as atenções dos verdadeiros problemas, uma vez que deixou de ocupar-se com a função administrativa para passar a preocupar-se com a função jurisdicional. Por outro lado, instituiu problemas de ambiguidades linguísticas (veja-se o 1º, 2). Por causa disto, o Prof. Vasco Pereira da Silva defende que o legislador deveria ter adoptado um caminho mais categórico, com menos incertezas e inseguranças de modo a não utilizar expressões equívocas.

Posto isto, cabe referir que a respectiva lei tem 3 vertentes de aplicação: no tocante à função administrativa (art. 7º-11º) – note-se que não existe a habitual distinção entre actos de gestão pública e gestão privada; no tocante à função jurisdicional (art. 12º-14º) e no tocante à função legislativa (art. 15º).
Conclusão: os pressupostos de efectivação de responsabilidade pelo exercício da função legislativa são mais restritivos do que às outras funções.

Para o Prof. Jorge Miranda esta lei falha por não tratar da responsabilidade por actos de função política em sentido restrito, da responsabilidade por preterição de decisão referendária, de responsabilidade por acções e omissões do Ministério Público e da responsabilidade por omissões legislativas para além da inconstitucionalidade por omissão.


Cristiano Dias, Subturma 8

Sem comentários:

Enviar um comentário