terça-feira, 25 de maio de 2010

Impugnação de Normas - Possível Inconstitucionalidade do art. 73 Nºs 1 e 2 CPTA



1. “Velho” versus “Novo” Regime de Impugnação de Normas:

Antes da reforma de 84/85, era possível reagir contenciosamente contra regulamentos administrativos mediante três formas distintas:
1, Via incidental: o regulamento era apreciado apenas indirectamente, como incidente da questão principal, pois o que estava em causa era o recurso directo de anulação de um acto administrativo cuja ilegalidade era consequente da aplicação de regulamento inválido, levando à anulação do acto administrativo, que vinha acompanhada da não aplicação do regulamento ao caso concreto, mas não levava ao afastamento do regulamento ilegal em abstracto.
2, Um meio processual genérico: A declaração de ilegalidade de normas administrativas (art.66 LPTA), era um meio utilizável contra qualquer norma regulamentar, independentemente do órgão ou da entidade de que fosse proveniente, mas na condição de se tratar de uma norma exequível por si mesma, ou de já ter sido antes declarada ilegal ( a titulo incidental) em 3 casos (art.51/1/a LPTA).
3, Um meio processual especial: A impugnação de normas (art.63 e seguintes da LPTA). Este meio tinha um âmbito de aplicação limitado, pois respeitava apenas a regulamentos provenientes da denominada administração local comum, mas em contrapartida não estava sujeito às condições estabelecidas para a via anterior, verificando se uma espécie de assimilação processual dos regulamentos aos actos administrativo.

Deste modo, antes da reforma, o contencioso dos regulamentos administrativos era marcado pela ideia de dualidade de meios processuais. Dualidade, considerada por VASCO PEREIRA DA SILVA, como de “esquizofrénica”, já que os referidos meios processuais apresentavam requisitos diferentes, para realidades que eram substancialmente idênticas, e ainda por cima, possuíam uma âmbito de aplicação, parcialmente sobreposto.
Importa ainda salientar que no quadro legal da LPTA, os efeitos da declaração de ilegalidade de uma norma, bem como os das decisões de provimento dos recursos do art.51/1/e LPTA e que surgem plasmados no art.11 do ETAF/1984, nos seus termos a sentença que conclua pela ilegalidade do regulamento dispõe de força obrigatória geral e efeitos repristinatórios, mas apenas produz, em regra, efeitos ex nunc. Em casos de excepcional interesse publico, ou quando razões de equidade o recomendem, o tribunal pode, contudo, reportar a produção de efeitos para momento anterior. Não obstante a consagração do regime inverso no que toca aos efeitos no tempo, são evidentes as semelhanças com o regime de efeitos das declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral do Tribunal Constitucional ( art.282 CRP), o qual serviu claramente de inspiração ao ETAF/1984.

O novo CPTA uniformizou o regime processual da impugnação de normas, aboliu a dualidade de meios processuais prevista na LPTA, unificando sob a égide de um único mecanismo a impugnação de normas. Contudo, essa unificação é apenas aparente, uma vez que nas palavras de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, à dualidade de meios processuais sucede uma dualidade de regimes quanto aos efeitos da declaração de ilegalidade. Para além da declaração de ilegalidade com força obrigatória geral (art. 73/1 e art.76 CPTA), o que já acontecia na legislação anterior, somos agora confrontados com a possibilidade de uma pronúncia jurisdicional sem esses efeitos obrigatórios gerais, ou seja, com efeitos circunscritos ao caso concreto art.73/2 (recorrendo, porventura, à máxima, tal como refere VASCO PEREIRA DA SILVA, “não me pronuncio em abstracto porque é muito concreto”).
Esta dualidade levanta diversas interrogações, podemos até questionar-nos se não estaremos, na prática, segundo PEDRO DELGADO ALVES, perante dois meios processuais distintos, atentas as diferenças de pressupostos e efeitos.
Resulta dos artigos 72 e 73 CPTA que se admitem dois tipos de pedidos, sujeitos a regimes diferentes: o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral e o pedido de declaração de ilegalidade num caso concreto.
Atente-se contudo ao facto do “novo” regime estabelecer um regime uniforme, tomando como “padrão” o anterior meio processual genérico, ainda que com a introdução de alterações e – espante-se – de restrições aos requisitos de apreciação das normas regulamentares, nomeadamente relativamente ao pressuposto processual – Legitimidade.



2. Modelo Dicotómico de Impugnação e Normas Imediatamente e Mediatamente Operativas:

O CPTA manteve a dicotomia entre normas imediatamente operativas e normas mediatamente operativas. No primeiro caso, as normas produzem efeitos imediatamente na esfera jurídica dos interessados, normas exequíveis por si mesmas, independentemente da prática de um acto administrativo de aplicação (art.73/2); no segundo caso, a disciplina geral e abstracta das normas só é susceptível de operar os seus efeitos através de actos administrativos de aplicação a situações individualizadas (art.73/1).
A distinção opera quanto aos efeitos do pedido de declaração de ilegalidade. Tratando se de uma norma imediatamente operativa, o lesado poderá, desde logo, formular o pedido de declaração de ilegalidade, mas os efeitos da decisão são circunscritos ao seu caso concreto. Nestes termos a decisão não determina a eliminação da norma da ordem jurídica, mas a apenas a sua desaplicação à situação sub júdice, podendo continuar a ser aplicada, no futuro pela Administração. Tem pois, apenas, o alcance de impedir que a norma ilegal possa ser aplicada ao interessado. No que concerne às normas mediatamente operativas, e dado que elas se não projectam, de forma directa, na esfera jurídica dos cidadãos, mas apenas por via de um acto individual e concreto, a formulação do pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, por um lesado ou potencial lesado conduz à eliminação da norma da ordem jurídica, mas está dependente de ter ocorrido já a desaplicação da norma, com fundamento em ilegalidade, em três casos concretos.
A circunstância de uma norma ser imediatamente operativa não impede que seja igualmente objecto de um pedido de declaração de ilegalidade com efeito erga omnes. O que sucede é que tal norma poderá ser impugnada directamente, independentemente da prática de um acto de aplicação, mas com efeitos circunscritos ao caso concreto, ao passo que o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, quando apresentado por simples particulares, terá sempre de preencher os requisitos do 73/1, ou seja depende da ocorrência mediante decisão judicial anterior, de três casos de concretos de desaplicação. É este o único sentido útil, tal como referem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e PEDRO CADILHA, da ressalva contida no segmento inicial do 73/2. Já o Ministério Publico (doravante MP) pode pedir a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral sem necessidade da verificação da recusa de aplicação da norma em três casos concretos (73/3). Diga-se ainda, que o lesado por uma norma directamente aplicável, mas já incidentalmente julgada ilegal por três vezes, não está obrigado a pedir a declaração de ilegalidade dessa norma com força obrigatória geral. Ele pode limitar-se a pedir que a declaração seja proferida com efeitos circunscritos ao seu caso, evitando, desse modo, o risco de se ver confrontado com uma decisão de limitação de efeitos, conforme prevê, por razões de segurança jurídica ou equidade, art.76/2.


3. Pressupostos de aplicação: Pressuposto relativos às Partes - Legitimidade Activa; Pressuposto Relativo ao Processo – Existência de 3 Casos Concretos de Desaplicação.

A legitimidade activa para impugnação de regulamentos, por força do art.73/1, têm-na aqueles que tenham sido ou estejam a ser prejudicados pela sua aplicação imediata (através de actos administrativos) ou imediata ( no caso dos regulamentos directamente operativos), e aqueles que “possam previsivelmente sê-lo em momento próximo”.
Citando MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, no primeiro caso, será possível falar-se de uma legitimidade interessada, sendo o critério aplicável o do interesse directo e pessoal do autor na invalidação da norma. No segundo caso, da legitimidade pré-interessada, o critério, segundo a lei, reconduz-se à previsibilidade de lesão em momento próximo.


3.1. Legitimidade dos Particulares


3.1.1. Legitimidade pré-interessada: A previsibilidade (ou possibilidade) de ocorrência de lesão em momento próximo – Interesse em Agir. (art.73/1)

Exige-se do tribunal, neste caso, dois juízos de prognose de alguma complexidade, inclusive trata-se de um critério muito próximo daquele consagrado no art.63 LPTA e no nº2 do § 47 da lei processual alemã, no fundo, exige-se uma lesão ou uma potencial lesão da esfera jurídica do autor para que este possa deduzir o pedido. O primeiro respeita à existência de uma possibilidade séria de lesão do autor, possibilidade que corresponde portanto a um juízo sobre a verosimilhança dessa ocorrência, não um juízo terminante ou concludente, existindo três casos em que tal lesão pode ocorrer: 1, o autor pode vir a ser abrangido por um acto de aplicação da norma regulamentar desfavorável; 2, o autor pode vir a ser excluído da uma norma regulamentar favorável em virtude da ilegalidade dos pressupostos ou requisitos aí figurados; 3, a última, relativa a de um terceiro sair, ilegitimamente, beneficiado por um acto jurídico ou material de aplicação da norma regulamentar ilegal, em termos que possam considerar-se lesivos da posição jurídica (oposta) do autor da acção de impugnação.
Verificada a possibilidade de lesão do autor, impõe-se, para o considerar como “ pré-interessado”, nas palavras de MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, na impugnação da norma regulamentar, averiguar seguidamente da proximidade temporal da aplicação dessa norma – porque se tal aplicação se anunciar bem possível mas longínqua, não lhe é reconhecida esta legitimidade. [Cumpre perguntar, tal como faz PEDRO DELGADO ALVES, se não será possível, um particular socorrer-se da possibilidade da faculdade do 73/3? Mesmo perante a inexistência de uma eventual lesão? Explicando: saber se o particular for em simultâneo também um actor popular em virtude da sobreposição dos interesses, directo e pessoal, por um lado, e por outro, se também for titular de um interesse ou direito legalmente protegido ao abrigo do art.9/2. Cumpre saber se o particular pode requerer ao MP ( uma vez que este não se encontra dependente de qualquer destes requisitos constantes no nº1 e nº2, maxime, a existência de um potencial lesão ou da existência de 3 casos concretos anteriores de desaplicação) o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, e por conseguinte constituírem-se assistentes do MP. A resposta parece ser positiva, uma vez que extrapolamos o interesse directo, pessoal e concreto de um particular em especifico, para estarmos perante um bem constitucionalmente protegido e de manifesto interesse publico ao abrigo do art.9/2. Uma outra questão que importa (aproveitando esta problemática) colocar, prende-se com a interpretação do “requerimento” para efeitos do 73/3, ou seja, saber se o MP terá a eventual discricionariedade nos casos em que lhe for requerido a dedução do pedido. Importa perguntar se estamos perante um caso de pedido obrigatório para o MP ou ser-lhe-á permitido elaborar um juízo autónomo a esse respeito? Estará o MP vinculado ao requerimento do particular ou entidades previstas no art.9/2? Parece-me que será necessário ter alguma cautela neste domínio, sob pena de onerarmos o MP com o despoletar de infindáveis processos de impugnação de normas. O mais razoável, será dotar o MP de alguma margem de manobra, impondo-lhe contudo, tal como refere PEDRO DELGADO ALVES e MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, um especial (diria mesmo, especialíssimo) dever de fundamentação nos casos em que opte por não dar seguimento a um requerimento formulado por uma das pessoas e entidades do art.9/2. Não obstando que se possa interpor recurso, junto do tribunal administrativo competente, para o Procurador Geral da Republica, ao abrigo do art.76 dos Estatuto do MP].
A proximidade ou lonjura temporal do acto ou operação de aplicação da norma em causa é sempre relativa, depende das circunstâncias concretas de cada caso, sem se poder apontar, como salienta MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, um padrão teórico ou categorizante absoluto nem geral. Com efeito, cumprirá ao particular demonstrar a previsibilidade e iminência do dano na sua esfera jurídica. A iminência de lesão não poderá, todavia, conduzir a uma diminuição das garantias dos administrados. Se forçarmos o particular a aguardar até ao momento em que a lesão passe de meramente previsível a perigosamente próxima, estaremos a criar um risco desnecessário à sua esfera jurídica, penalizando a diligência processual, o factor a privilegiar na aferição da legitimidade activa deverá ser, a previsibilidade da lesão, remetendo-se a proximidade temporal a um papel complementar para casos de fronteira.


3.1.2. O pressuposto processual da tripla desaplicação judicial (prévia) da norma impugnada (art.73/1/ parte final). Impugnação de regulamentos imediatamente operativos (art.73/2)

Além da questão da legitimidade tratada na sua parte inicial, art.73/1, na sua parte final, institui o pressuposto processual especifico da declaração de ilegalidade com força obrigatória geral de normas administrativas, mediatas ou imediatamente operativas: que a aplicação da norma impugnada já tenha sido recusada em três casos concretos, com fundamento em ilegalidade, pressuposto que só não se aplica aos referidos casos no nº3. Refere MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, que o legislador não quis que se enveredasse por um processo de eliminação judicial de normas jurídicas, com o relevo ordenamental que isso tem (atente-se ao art.76/1 e ao carácter ex tunc da sentença), sem que houvesse já algum prenúncio consistente na sua legalidade (Cumpre infra na exposição averiguar se este argumente procederá…Pelo menos a nível constitucional. Em termos lógicos e de segurança jurídica compreende-se.).
Na falta, de 3 casos de recusa, ou se estivermos perante um norma regulamentar exequível por si mesma, o particular tem legitimidade para o pedido de declaração da ilegalidade com efeitos circunscritos ao caso concreto, quando os efeitos de tais normas (ou, não esquecer, na falta de 3 casos concretos de desaplicação) se projectam directamente sobre a esfera jurídica das pessoas abrangidas pela sua previsão sem necessidade de um acto administrativo ou jurisdicional de aplicação da referida estatuição. É o que sucede, por via de regra, com normas administrativas que proíbem uma certa conduta aos respectivos particulares, outrora admitida, ou que lhes impõem uma conduta especifica, antes não exigível.
Como referem, mais uma vez citando MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, os meios de reacção contenciosa ao dispor dos administrados, nestas circunstancias, têm de ser diferentes dos previstos para normas só mediatamente operativas. Nesta sede, importa as exigências ou requisitos da lesão ou da previsibilidade de uma lesão próxima, não sendo necessário que a norma impugnada já tenha sido desaplicada em três causas judiciais.
Neste caso a declaração de ilegalidade é pedida com “efeitos circunscritos ao caso concreto”, e assim, referem os mesmos autores, já não são necessários o cuidado e ponderação que se exigem quando se trata mesmo de expurgar três decisões de desaplicação transitada



3.2. Legitimidade do Actor Público (art.73/3)

No que se refere à acção pública, o MP pode pedir a declaração de ilegalidade, mesmo quando não se verifiquem os três casos concretos de desaplicação, não se estabelecendo qualquer condição de eficácia às normas jurídicas, nem estando sujeito ao requisito da lesão, estamos perante a afamada acção publica “desinteressada”. O MP vê ampliada, face ao anterior regime da LPTA, a sua intervenção, do ponto de vista das condições de procedibilidade dos regulamentos, pois tanto pode impugnar normas jurídicas de eficácia imediata, como aquelas de dependem de acto administrativo ou jurisdicional de execução. Saliente-se ainda o dever de pedir a declaração de ilegalidade nos termos do art.73/4



4. Considerações Finais


Uma vez exposto o regime e os consequentes requisitos, quer relativos às partes quer relativos ao processo, o que dizer sobre este regime, nomeadamente face ao regime anterior da LPTA?

Citando VASCO PEREIRA DA SILVA “A apreciação das “novidades” deste regime jurídico do contencioso dos regulamentos levanta um sem-número de questões e as soluções encontradas, são, em muitos casos, fonte de grande “perplexidade””, Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, pág.418.
Posicionando-nos no topo da pirâmide de Kelsen, importa fazer referência ao regime constitucional, nomeadamente, ao artigo 268.º, n.º 5 da CRP: “Os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos”.
Evocando tal preceito constitucional, preceito este de carácter subjectivista (veja-se a referência à lesão dos direitos dos administrados, veja-se também o cerne do art.73/1, que foca a legitimidade do particular na iminência de lesão), importa confrontá-lo com o tratamento do particular em sede de impugnação de normas no actual CPTA, com particular atenção às condições de que depende a impugnação de regulamentos.


Verificámos supra que as condições de legitimidade diferem consoante a legitimidade activa, confronte-se 73/1 e 2 e o 73/3, o MP enquanto defensor da legalidade democrática, não está dependente nem do critério da lesão, nem da existência prévia de 3 casos de desaplicação com fundamento na sua ilegalidade. Ou seja, primeiro restringe-se as possibilidades de o particular poder pedir com força obrigatória geral a declaração de ilegalidade ( particular, que será de facto o verdadeiro lesado pela norma); num segundo patamar, equipara-se o particular ao actor popular, para efeitos do 73/2; depois de comparar e submetendo-os aos mesmos condicionalismos, vêm-se admitir que o actor popular possa solicitar a intervenção do MP, podendo o actor popular constituir-se assistente deste. Tal como saliente VASCO PEREIRA DA SILVA, primeiro não se entende o porquê da diferenciação entre actor popular e actor publico, e depois ( hipótese mais macabra) o actor popular que defende a legalidade e o interesse publico possa constituir-se assistente do MP (art.73/3), sem possuir qualquer interesse na demanda, mas já o particular (reitere-se, este sim o verdadeiro lesado!) não o possa fazer. Perante este contrasenso, VASCO PEREIRA DA SILVA, admite mesmo uma interpretação correctiva de tal preceito, permitindo que o particular se possa constituir como assistente do MP nos processos em questão, socorrendo-se de uma interpretação sistemática, ponderando os interesses em jogo e ainda apelando ao respeito necessário pelo Principio da tutela jurisdicional efectiva.

De facto, é imperioso chamar a atenção para uma eventual inconstitucionalidade dos referidos números 1 e 2 do art. 73 CPTA, nomeadamente por 2 ordens de razões. Passo a explicar:


1.

É vedado ao particular a possibilidade de suscitar a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral quando não se encontrarem reunidos três casos concretos de desaplicação da mesma, o particular não pode usar mão deste meio, parecendo tal restrição ir contra o cariz subjectivista do referido preceito constitucional.
VIEIRA DE ANDRADE, salienta que os direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares são plenamente protegidos quando se trata da declaração com efeitos restritos ao caso concreto, não há qualquer requisito adicional, bastando que os efeitos da norma se produzam imediatamente e que lesem o particular, assim se respeitando o artigo 268.º, n.º 5 da CRP. Quanto à declaração com força obrigatória geral, como o próprio autor salienta, desta ressalta um cariz mais objectivista, perspectivando a questão como de interesse público, permitindo a intervenção mais facilitada do MP.
VIERIRA DE ANDRADE, acaba por espelhar o pensamento de VASCO PEREIRA DE SILVA, quando este refere que o MP é hoje o actor principal do contencioso de impugnação de normas: sem qualquer condicionalismo, seja a norma exequível ou não. No pólo oposto encontra-se o particular, o efectivo lesado, apenas pode impugnar a norma não exequível havendo três casos concretos de desaplicação, e quando se trate de norma exequível, se aqueles três casos não estiverem reunidos também só pode requerer a declaração de ilegalidade com efeitos circunscritos ao caso concreto.
Face ao exposto, penso ser manifesto o carácter objectivista, inclusive mais objectivista do que vigorava na LPTA. Saliente-se o primeiro ponto desta exposição. A declaração de ilegalidade de normas administrativas impunha que a norma ou fosse exequível por si mesma, ou tivesse sido declarada incidentalmente ilegal em três casos, sendo que o meio especial de impugnação de normas, o qual se aplicava apenas aos regulamentos da administração local, não estava sujeito a este requisito de desaplicação em três casos concretos. Hoje, quando a norma for imediatamente aplicável, é possível requerer a sua ilegalidade, sem necessidade de três casos de desaplicação, é possível, mas repare-se nos efeitos dessa declaração! “Circunscritos ao caso concreto”(73/2)!
É notório que o actual regime implica uma forte restrição ao princípio da tutela jurisdicional efectiva retratado no artigo 268.º, n.º 5 CRP. E os fundamentos para tal restrição, a este direito fundamental, serão válidos? Passarão pelo crivo do Principio da proibição do Excesso?


2,
Chame-se novamente à colação os argumentos de MÁRIO e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA, que referem que o legislador não quis que se enveredasse por um processo de eliminação judicial de normas jurídicas, com o relevo ordenamental que isso tem, sem que houvesse já algum prenúncio consistente na sua legalidade. Se é certo que, perante os efeitos ex tunc da sentença, art. 76/1, estes efeitos exigem as maiores cautelas, uma vez que vamos erradicar da ordem jurídica uma norma jurídica, já o MP pode fazê-lo a todo o tempo, sem qualquer restrição, uma vez que este estaria a defender um interesse público, não esquecer que estamos no âmbito da acção pública”desinteressada”. Contudo no regime da LPTA, tal segurança jurídica aquando da erradicação da norma da ordem jurídica, era salvaguardado pelos efeitos ex nunc da sentença, art. 11 ETAF/1984( veja-se o que se disse no ponto 1 desta exposição), não se compreende que agora a segurança jurídica e o “relevo ordenamental” já possa servir ( mediante os condicionalismos impostos, desaplicação de 3 casos concretos ou caso contrário o particular só poderá pedir a declaração com efeitos circunscritos ao caso) para restringir um direito fundamental, marcadamente subjectivista, art.268/5 CRP!


Ana Catarina Matos, Subturma 8

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