segunda-feira, 17 de maio de 2010

Parecer do Ministério Público

Âmbito de Jurisdição: A jurisdição competente é a jurisdição administrativa, nos termos do artigo 4º/1 a) do ETAF.

Legitimidade: O Ministério Público, enquanto organismo estadual, a quem está cometida a tarefa de zelar a título institucional pela defesa da legalidade e do interesse público, nos termos do artigo 219º da CRP e artigo 1º do Estatuto do Ministério Público aprovado pela Lei 47/86 de 15 de Outubro, é desde a Reforma do Contencioso Administrativo de 2004 um ente com poderes alargados de intervenção no processo, neste caso, a nível de emissão de pareceres, à luz do artigo 85º/1 do CPTA.

Nestes termos, foi intentada no Tribunal Administrativo do Círculo de Desempregados uma acção de impugnação do acto administrativo de nomeação em concurso público do cargo de Director do Centro de Emprego do Município de Desempregagos, nos termos do artigo 46º/2 a) do CPTA.

Questões que nos cumpre apreciar:

1) Petição Inicial: A petição inicial deve conter todos os requisitos exigidos pelo artigo 78º/2 do CPTA. Nos termos do artigo 79º/1 e 2 do CPTA, devem ser entregues juntamente com a petição inicial a procuração forense com os poderes necessários e suficientes da representação judiciária, o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial e o documento comprovativo da prática do acto impugnado.
A petição inicial deve ser recusada pela Secretaria, indicando por escrito o fundamento da rejeição, quando existindo contra-interessados, não proceda o autor à sua identificação e respectiva residência e omita o valor da causa, de acordo com o artigo 80º/1 b) e c) do CPTA.
Tais irregularidades, obstam ao prosseguimento do processo nos termos do artigo 89º/1 a) e f) do CPTA.
As deficiências formais de que enferma esta petição inicial devem ser oficiosamente supridas pelo juiz, de acordo com os artigos 88º e 89º do CPTA.

2) Contestação: Atendendo ao artigo 83º/1 do CPTA, a entidade demandada deve deduzir toda a matéria relativa à defesa e juntar os documentos destinados a demonstrar os factos cuja prova se propõe fazer. Neste sentido, não foram detectadas qualquer tipo de irregularidades formais.

3) Legitimidade Activa:

- António José Atento: Artigo 55º/1 a) do CPTA
A legitimidade individual para impugnar actos administrativos não tem de basear-se na ofensa de um direito ou interesse legalmente protegido, basta que o acto no momento em que é impugnado estar a provocar consequências desfavoráveis na esfera jurídica do autor, de modo a que a declaração de nulidade ou a anulação desse acto lhe traga pessoalmente uma vantagem directa.
Por um lado, o carácter pessoal do interesse está relacionado com a utilidade pessoal, isto é, a utilidade que o interessado pretende obter para si com a declaração de nulidade ou anulação do acto impugnado.
Por outro lado, o carácter directo do interesse está relacionado com a ideia de actualidade, no sentido de que existe uma situação de efectiva lesão que justifica a utilização do meio impugnatório.

- Luís Sindicalista: Artigo 55º/1 c) do CPTA
As entidades privadas, como os sindicatos, podem impugnar actos administrativos em defesa dos direitos e interesses que lhes cumpra defender, que neste caso seria a defesa dos direitos dos trabalhadores da Função Pública.
Podem pois, agir em processo no respeito pelo Princípio da Especialidade em defesa dos direitos e interesses dos seus associados.

4) Legitimidade Passiva:

- Instituito Público de Emprego e Formação Profissional: Artigo 10º/2 do CPTA.

5) Contra-Interessados: Artigo 57º do CPTA

É considerado contra-interessado quem tenha interesses que podem ser directamente afectados na sua consistência jurídica com a procedência da acção administrativa, logo João Sempre Disponível, é considerado contra-interessado e, como tal, deve ser obrigatoriamente demandado.

Questão Central:
O Instituito de Emprego e Formação Profissional procedeu à nomeação de João Sempre Disponível para Director do Centro de Emprego do Município de Desempregados em regime de substituição do seu anterior Director ( o mesmo João Sempre Disponível), sem ter procedido à abertura do necessário concurso público para o provimento do cargo.
O Presidente do Instituito de Emprego e Formação Profissional, Manuel Venham mais Cem, justifica esta nomeação com base nos seguintes argumentos:

- Falta de pessoal e falta de candidatos ao cargo;

- Graves carências da população que necessitam de um serviço sempre disponível, dada a sua relação de proximidade com a localidade e facilidade de articulação dos serviços;

- As habilitações literárias não deixam margem para dúvida quanto às máximas competências que o serviço em causa exige;

De facto, de acordo com o artigo 27º/1 da Lei 2/2004 de 15 de Janeiro, permite-se que os cargos dirigentes possam ser exercidos em regime de substituição mas, somente em casos de ausência ou impedimento do respectivo titular, quando se preveja que estes condicionalismos persistam por mais de dois meses.
Nos termos do nº2 do referido artigo, a nomeação é feita pela entidade competente, devendo ser observados os requisitos legais exigidos do artigo 21º da Lei 2/2004.
A substituição cessa na data em que o titular retome funções ou, passados 2 meses sobre a data da vacatura do lugar, salvo se estiver em curso procedimento tendente à nomeação de novo titular, arigo 27º/3 da Lei 2/2004.
No caso em apreço, o concurso estava a ser preparado pela secção responsável pelos Recursos Humanos, tal como pode ser constatado na circular interna nº 2087 que procedeu à sua divulgação.
Contudo, a abertura do concurso público não se verificou pois, considerou-se que o candidato mais adequado seria sempre o João Sempre Disponível, não tendo havido mais candidatos, argumento que não procede, violando desta forma os Princípios da Legalidade, Imparcialidade, Transparência e Boa Fé, nos termos do artigo 4º da Lei 2/2004.
A escolha do candidato deve pautar-se por critérios objectivos, impostos pelo artigo 20º/1 a), b) e c) da Lei 2/2004, não podendo ser tidos em consideração critérios meramente aleatórios.
Como se encontra estipulado no artigo 21º/2 da Lei 2/2004, a escolha deverá recair no candidato que melhor corresponda ao perfil pretendido para prosseguir as atribuições e objectivos do serviço.
Independentemente de a eventual escolha de António Atento não respeitar os critérios do artigo 20º/1 a), b) e c) da Lei 2/2004, tal facto só pode ser tido em conta após a abertura de concurso e selecção dos candidatos.
Como é exigido por lei, artigo 21º/1 da Lei 2/2004, para a abertura de concurso público é necessária a sua publicação no Diário da República 2ª série.
Esta possibilidade de prolongamento da substituição, prevista no artigo 27º/3 da Lei 2/2004, constitui um grave entrave de acesso a cargos públicos a potenciais candidatos, podendo inclusive dar azo a eventuais abusos por parte do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração Pública, violando desta forma o artigo 50º da CRP.
O direito de acesso a cargos públicos é um direito de participação constitucionalmente protegido, tal como se encontra previsto no artigo 50º da CRP.
Concluímos, pela necessidade de abertura de concurso público, respeitando todos os requisitos e critérios impostos por lei, de forma a que todos os cidadãos tenham a possibilidade de concorrer em condições de igualdade e de liberdade a cargos públicos postos à disposição.

Sem mais a acrescentar,

Os Procuradores,

Ana Isabel Mendes Silva

Joana Bento

José Nascimento

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