sábado, 22 de maio de 2010

Alegações Finais - Ministério Público (subturma8)

Exmo. Juiz de Direito do Tribunal Administrativo de Círculo de Cascos de Rolha

Antes de começarmos a explicitar as nossas alegações finais, gostaríamos, desde logo, de deixar bem claro que o Ministério Público não é parte deste processo. A nossa participação visa o esclarecimento da verdade e o respeito pela legalidade, gostaríamos que não fosse colocada em causa a nossa actuação, tendo em conta que agimos nos termos dos nosso poderes.

1.Facto dado como não provado: Abertura de Concurso

Fora apresentado o Despacho de Abertura de Concurso Nrº 29/2010, que referia que fora aberto, mas que a concretização dos requisitos do concurso de recrutamento seria apenas feita em despacho posterior a publicar no Diário da República. Sendo que a abertura de concurso resulta de imposição legal, art.21/2 ( ex vi art. 20/1) da Lei 2/2004, com a redacção da lei 51/2005.
Posto isto, cabe concluir que a abertura de concurso inexiste, uma vez que mais do que uma condição de eficácia, a publicação em Diário da República é per si condição de validade do dito concurso.

2. Pedido de Anulação:

a) 1ª Nomeação:


Esta considera-se ser válida, por 60 dias, conforme disposto no art.27/1/ 1ªparte da Lei 2/2004 e art.27/3/1ª parte também da Lei supra citada. Não obstante, tal nomeação é inimpugnável, por fundamento na sua intempestividade. Vejamos: a 1ª nomeação ocorreu a 21 de Janeiro (apesar de só ter sido publicada em DR no dia 23 Março, nada impede a retroacção dos efeitos a 21 de Março) e esta só foi impugnada em Maio, deste modo não se verifica um dos pressupostos processuais, maxime a Oportunidade, os 3 meses referidos no art.58/2/b CPTA já foram ultrapassados. Importa salientar que nem o acto seria lesivo para efeitos do art.51/1 CPTA.

b) 2ª Nomeação:

Damos como Facto Não Provado: A Aceitação Tácita do acto administrativo, para efeitos do art.56ª, nº1 e nº2, CPTA, deste modo este argumento não poderia levar a inimpugnabilidade do acto.

Só existe uma aceitação tácita, não face a comportamentos expressos, mas sim face a comportamentos concludentes por parte do particular que levem à conformação dos efeitos desfavoráveis do acto. Ora o Ministério Público considera que “Sorrisos Nervosos”, seja lá o que isto for, não têm um valor probatório suficiente para fundamentar a aceitação do acto para efeitos do art.56/2 CPTA. Gostaríamos ainda de apelar à sensatez em sede de interpretação do referido preceito. Uma vez que não estamos só a pôr em causa a impugnabilidade ou não de um acto administrativo por falta de um pressuposto processual, interesse em agir. Estamos a pôr em causa e a restringir um direito fundamental! O direito de acesso à justiça administrativa, art. 268/4 CRP! Estamos no âmago da restrição a direitos fundamentais! Com efeito, é necessário para que tal restrição seja possível, que o seu motivo ( mormente o fundamento da aceitação tácita) passe pelo crivo do Principio da Proibição do Excesso nas suas três vertentes, Principio este basilar em sede de restrições a direitos fundamentais. O Ministério Público considera que “um sorriso nervoso” é claramente insuficiente para tal restrição, e para que seja considerado como bastante para uma possível aceitação tácita nos termos dispostos no 56/2 CPTA.

Importa ainda referir, que relativamente a uma possível “Prorrogação” da 1ª nomeação em substituição, esta não será válida. Só seria possível se estivéssemos perante a hipótese, reitere-se, não provada, de prévia abertura de concurso, só perante tal facto é que seria possível a referida prorrogação nos termos da ressalva da parte final do art.27/3 da Lei 2/2004. Uma vez dado como assente a não abertura a parte final do referido artigo não será de aplicar.

Interessa ainda fazer um breve esclarecimento, caso existisse e fosse legalmente válida a referida prorrogação, esta nunca teria natureza confirmativa. Senão vejamos: Ela versa sobre o mesmo sujeito e o mesmo objecto. Contudo, atente-se ao facto inquestionável, ser a referida prorrogação que obsta à caducidade do acto administrativo outrora praticado, nomeadamente obsta à caducidade da 1ºNomeação em substituição.

Evocamos ainda atenção para os preceitos, todos eles da Lei 2/2004:
Artigo 27/5 - “O período de substituição conta, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço prestado no cargo anteriormente ocupado, bem como no lugar de origem.”;
Artigo 29/2 – “Quando o tempo de serviço prestado em funções dirigentes corresponda ao módulo de tempo necessário à promoção na carreira, o funcionário tem direito, findo o exercício de funções dirigentes, ao provimento em categoria superior com dispensa de concurso, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado naquelas funções.”
Artigo 29/4 — “O tempo de serviço prestado em regime de substituição e de gestão corrente, nos termos da presente lei, conta para efeitos do disposto no n.o 2.”

Ora para além dos inovatórios efeitos temporais, que fazem perdurar na ordem jurídica um acto que já deveria estar extinto por decorrência de um prazo certo, têm ainda efeitos no âmbito da antiguidade para efeitos de promoção (automática! Veja-se o art.29/2) na carreira. O Ministério Publico considera ser claramente manifesto que o referido acto administrativo secundário tem natureza inovatória.

Relativamente ao fundamento invocado, “extrema urgência” (que aliás não ficou provada) para a existência de uma 2ªNomeção: O Ministério Público não poderia considerá-lo mais improcedente, inclusive, diríamos mesmo inconstitucional.

Comecemos por analisar a ratio do preceito 27º da Lei 2/2004. Este é, de facto, um regime transitório, que por razões de eficiência, eficácia e praticabilidade, torna possível a nomeação precária para efeitos de ocupação do cargo vago, quer seja por razões de vacatura de posto, incompatibilidades ou impedimentos, inclusive, de forma a assegurar alguma continuidade dos meios empresariais do Instituto. Contudo o regime é meramente transitório, tem como “luz ao fundo do túnel” a abertura de concurso. É certo que a Lei2 /2004 nada refere quanto a uma eventual proibição de nomeações em substituição subsequentes. Todavia, uma vez não aberto concurso, o Ministério Público pensa ser nitidamente ilegal, admitir duas, três, quatro, no fundo substituições ad ifinitum. Ora admitir tal solução e interpretação contrária da daqui propugnada, viola o preceito constitucional que garante o acesso a cargos públicos art.50º CRP. Chamamos mais uma vez à colação o Principio da Proibição do Excesso e necessidade de o ultrapassar, com o intuito de reiterar que tal fundamento alegado pelos réus (de urgência na ocupação do cargo) não serve para realizar uma 2ª substituição.

3. Pedido de Condenação

Uma vez que a nosso entender o concurso não foi aberto, como é exigido pela lei, concluímos pela existência de uma atitude de inércia por parte da Administração, originando a não emissão do acto administrativo devido (leia-se: abertura do concurso).

Assim, está preenchido o pressuposto da alínea b) do nº1 do art.67º do CPTA, sendo a Administração condenada a abertura do concurso (art. 66º, nº1).

4. Pedido de Indemnização

Quanto ao pedido de indemnização e no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, como sabemos, esta é a obrigação que recai sobre uma entidade envolvida em actividade de natureza pública que tiver causado prejuízos aos particulares.

Não há, como se sabe, responsabilidade civil sem prejuízo.

O objectivo primeiro da responsabilização do Estado e de outras entidades envolvidas no exercício de actividades de natureza pública é a transferência do dano sofrido pelo cidadão para o seu causador. A reparação abrange toda a extensão dos prejuízos, os danos patrimoniais como os danos morais, e tanto os danos já ocorridos como os futuros (cfr. artigo 3.º, n.º3 da Lei 67/2007);
A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais dos entes públicos, por facto ilícito de gestão pública, assenta na verificação cumulativa dos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano e o nexo de causalidade entre este e o facto. Aqui torna-se particularmente relevante a Lei 67/2007 e na ausência de quadro normativo relativo aos pressupostos e condições do dever de indemnizar, a aplicação directa e irrestrita dos princípios da responsabilidade aquiliana (483º do CC)

Perante aqui o caso exposto e as regras de direito acima referidas, consideramos como não provados os danos patrimoniais e não patrimoniais alegados pelos autores, pois parece não haver e não ter sido provado qualquer conexão entre os danos invocados e o facto de o processo de abertura do concurso para a admissão de novo director ter sido adiado, e note-se que cabia aos autores provar os danos, nos termos do 487º do CC, o que tal não aconteceu.

No nosso entender o único dano existente é o da violação da protecção da confiança nos actos administrativos segundo o artigo 6º A, n º2, alínea a) do CPA, que é claramente posta em causa uma vez que é criada uma expectativa de decisão em tempo útil.

5. Conclusão

Face ao exposto, o Ministério Público considera:

a) Que deve ser julgado improcedente o pedido de anulação da 1ª nomeação, por intempestividade, nos termos do 58º, nº2, alínea b) do CPTA.
b) Que deve ser julgado procedente o pedido de anulação da 2ª nomeação, uma vez que esta é ilegal, lesiva e inconstitucional, por violação dos direitos fundamentais dos cidadãos, em especial artigo 50º da Constituição.
c) Que deve ser julgado procedente o pedido de condenação da Administração à prática do acto devido, neste caso, à abertura do concurso, pois este é obrigatório.
d) Que deve ser julgado parcialmente procedente o pedido de responsabilidade civil extracontratual contra o Estado, uma vez que o único dano existente foi a violação da protecção da confiança nos actos administrativos (vide art. 6º-A do CPA), devendo o juiz avaliar a extensão desse dano.

Os Magistrados do Ministério Público:

Ana Catarina Matos,
Bárbara Azevedo,
Catarina Pinho,
Cristiano Dias,
Maria Barreiros,
Marina Mendes.

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